Abril é o mês da conscientização sobre o autismo.
Estima-se que no mundo, uma em cada 44 crianças sejam diagnosticadas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), sendo essa uma condição mais comum em meninos. Nos últimos 50 anos, estudos epidemiológicos têm demonstrado um aumento no diagnóstico de casos de TEA, mesmo esse número sendo muitas vezes subestimado, principalmente em países subdesenvolvidos.
Então, vamos lá: o que você realmente sabe sobre o autismo?
O que é Transtorno do Espectro Autista (TEA)?
O autismo é uma condição que afeta o neurodesenvolvimento em diferentes graus de comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem – além de diferentes interesses individuais que costumam ser realizados de forma repetitiva. Esse transtorno se inicia na infância, sendo que o primeiro diagnóstico costuma aparecer por volta dos cinco anos de idade, persistindo na adolescência e na idade adulta. É comum ainda que os sinais sejam acompanhados por outras condições, como epilepsia, depressão, ansiedade, déficit de atenção, hiperatividade e dificuldade para se alimentar.
Há vários casos em que os autistas recebem o diagnóstico apenas adultos, sendo “julgados” antes de diagnosticados como pessoas fechadas demais, tímidas ou mesmo antissociais. Na maior parte das vezes, associamos a condição a crianças, porém, é preciso compreender que o TEA pode acometer pessoas de todas as idades, inclusive adultos.
Nesses casos, adultos que não foram diagnosticados na infância podem viver com o chamado “autismo de grau leve” e receber esse diagnóstico tardio. Concluímos que o diagnóstico pode promover uma melhor compreensão de si mesmo, além de melhorar a qualidade de vida.
Eu assisti um seriado da Netflix, que se chama Amor no Espectro, no qual vários jovens relatam que só foram diagnosticados bem mais tarde e o quanto foi importante terem descoberto, porque depois de diagnosticados, sabiam que tinham um rumo a tomar.
Não há cura para o autismo, mas existem terapias adequadas para que o indivíduo possa ter um desenvolvimento saudável e minimizar o que for considerado negativo como resposta ao espectro ao longo do seu desenvolvimento.
Os sinais do autismo
Por se tratar de uma condição em espectro, os pacientes podem apresentar diferentes intensidades dos sinais de autismo. Alguns os apresentam de uma forma mais intensa, enquanto outros de uma forma mais branda.
Entre os sinais do autismo, podemos destacar:
- Dificuldade em manter contato visual;
- Manter-se mais isolado e sem interagir com outras crianças;
- Dificuldade em fazer novos amigos;
- Realizar movimentos repetitivos sem motivos aparentes;
- Interesse muito intenso em determinados assuntos (hiperfoco) e desinteresse total por outros;
- Ficar muito afetado ou aborrecido por mudanças na rotina e em seu dia a dia;
- Não falar ou repetir frases em momentos inadequados;
- Uso de linguagem repetitiva;
- Dificuldades de imaginação;
- Irritabilidade;
- Insônia;
- Falta de atenção;
- Hiperatividade;
- Sensibilidade sensorial (sente dificuldade de ficar em lugares com muito barulho, por exemplo).
Esses sinais costumam ser observados pelos pais ainda na infância, por isso o autismo muitas vezes é chamado de autismo infantil, embora seja uma condição que acompanha o paciente durante toda a vida.
Quais são os tipos de autismo?
Como diz a sigla, hoje não se fala mais em um só autismo, mas sim em um espectro. Portanto, existem diferentes tipos de TEA, entre eles:
Autismo clássico: de maneira geral, são pessoas voltadas para si mesmas, que não estabelecem contato visual, não se comunicam tradicionalmente por meio da fala e possuem dificuldade de compreensão de metáforas e enunciados simples. O grau de comprometimento pode variar de caso para caso;
Síndrome de Asperger: os pacientes apresentam as mesmas dificuldades de comunicação e interação, mas em um nível menor. Muitas vezes, são extremamente inteligentes, podendo ser considerados gênios nas áreas que dominam;
Distúrbio global do desenvolvimento sem outra especificação: o paciente é considerado do espectro autista por possuir dificuldade de comunicação e interação social, mas os sintomas não são suficientes para incluí-lo nas categorias anteriores, o que dificulta o diagnóstico;
Autismo regressivo: crianças com esse tipo podem não apresentar nenhum sintoma, mas com o avançar da idade ir perdendo as habilidades sociais ou linguísticas aprendidas.
Quais são os graus de autismo?
Existem pelo menos três graus de autismo, que são classificados como autismo leve, moderado e severo.
Grau 1: possuem a forma mais leve da condição, dispondo de uma maior independência e desempenhando tarefas do dia a dia com tranquilidade. Apresentam pouco interesse e dificuldade em iniciar ou manter interações sociais, problemas em se expressar, comportamentos repetitivos e restritos, dificuldade em trocar de atividade e problemas para organização e planejamento.
Grau 2: os sintomas podem ser percebidos com maior facilidade, uma vez que os pacientes com o grau moderado precisam de ajuda para realizar algumas atividades do dia a dia, além de apresentarem maior dificuldade de socialização, poderem ou não se comunicar verbalmente, não realizarem contato visual, possuírem comportamentos repetitivos em maior complexidade e seguirem rigorosamente uma rotina.
Grau 3: geralmente possui pouca autonomia, necessita de apoio constante para realizar atividades diárias e apresenta graves déficits de comunicação e interação social. Em alguns casos, não consegue se comunicar verbalmente e precisa do suporte de um mediador e, por isso, é considerado autismo severo.
Como tratar o TEA?
Os tratamentos de primeira linha do TEA podem ser classificados como não farmacológicos ou farmacológicos. A terapia não farmacológica envolve o cuidado profissional dos aspectos cognitivos, de comunicação e de interação social. Já os tratamentos farmacológicos buscam tratar as comorbidades ou disfunções secundárias que costumam acometer essa população, incluindo distúrbios do sono, ansiedade, irritabilidade, agressividade, bem como os comportamentos repetitivos.
Os tratamentos não farmacológicos do TEA são elaborados por profissionais habilitados e incluem intervenção educacional, desenvolvimento comportamental e de interações sociais, bem como terapia cognitivo-comportamental. Esses tratamentos tendem a atenuar as alterações psicológicas secundárias de pessoas com TEA, tais como ansiedade, depressão, regulação do comportamento social, da comunicação verbal e não verbal.
Suplementação no TEA
A dificuldade em se alimentar adequadamente é uma característica comum no TEA, sobretudo devido à seletividade alimentar. Como consequência, deficiências de macro e micronutrientes podem ser observadas em alguns casos e, se não manejadas de forma adequada, contribuem para o prejuízo no neurodesenvolvimento, maior vulnerabilidade a infecções e desenvolvimento de síndromes metabólicas.
Além disso, estudos têm demonstrado os benefícios da suplementação de vitaminas (B1, B6, B9, B12 e D) e magnésio, atenuando a manifestação dos sintomas associados a essa condição.
Nesse contexto, a suplementação com vitamina B1 (tiamina) tem sido associado à redução do estresse oxidativo e regulação dos níveis de neurotransmissores em indivíduos com TEA. Já a vitamina B6 (piridoxina) em associação ao magnésio, parece contribuir para a melhora da interação social e da comunicação, bem como para diminuição de estresse.
Já foi demonstrado, também, que a deficiência da vitamina B12 (cobalamina) pode desencadear alterações cognitivas e irritabilidade, sendo sua suplementação benéfica na diminuição dos sintomas clínicos do TEA. Adicionalmente, estudos demonstram os benefícios da suplementação da vitamina D, associada à diminuição da irritabilidade e hiperatividade em crianças com TEA. Lembrando mais uma vez que, embora sejam simples vitaminas e minerais, precisam de uma orientação profissional.
Eixo intestino-cérebro
Em função do envolvimento do eixo intestino-cérebro em distúrbios gastrointestinais–neurodegenerativos, existem evidências científicas relacionando está com o TEA. Estes problemas gastrointestinais não são explicados por anormalidades bioquímicas, uma vez que representam sintomas crônicos e recorrentes que incluem diarreia, constipação e dor abdominal crônica, provocados por possíveis deficiências enzimáticas, seletividade alimentar, intolerâncias e alergias.
Estudos registram que a prevalência de sintomas gastrointestinais (constipação, diarreia, flatulência, dor abdominal, refluxo, vômitos) encontrados em pessoas com TEA variam amplamente, de 9% a 91%.
A microbiota intestinal está diretamente envolvida na manutenção das barreiras intestinal e hematoencefálica, expressão de neurotransmissores e seus receptores, podendo modular a atividade cerebral e o comportamento dos indivíduos com o TEA.
Logo, pessoas no espectro autista podem apresentar um desequilíbrio da microbiota intestinal, podendo comprometer a saúde em decorrência do aumento da permeabilidade intestinal, que permite a entrada de microrganismos patogênicos e outras toxinas.
Além disso, a permeabilidade intestinal possibilita um aumento na circulação de LPS, que provoca um efeito negativo imunológico e resposta inflamatória, com aumento das citocinas pró-inflamatórias sistêmicas. Dessa forma, alguns autores teorizam que a integridade da barreia intestinal, a microbiota e os seus metabólitos podem contribuir para as alterações no desenvolvimento neurológico de pessoas com TEA.
Estudos que analizaram a suplementação de lactobacilos encontraram melhoras de sintomas gastrointestinais nos pacientes com TEA. Uma pesquisa realizada com 30 crianças autistas e 30 controles saudáveis por três meses demonstrou redução do peso corporal, bem como melhorias na gravidade do autismo e sintomas gastrointestinais após a suplementação com Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus rhamnosus e Bifidobacteria longum.
Em outro estudo, ao administrar Lactobacillus plantarum em crianças com TEA, durante 1 mês, identificaram a melhora de alguns sintomas como a hiperatividade e agressividade. Importante ressaltar que esta intervenção pareceu ter efeitos dependentes da idade, apresentando melhores efeitos em crianças mais novas.
Outros estudos que utilizaram associação de prebióticos e probióticos identificaram que tanto a oferta de prebiótico isolado quanto a associação com probiótico foram capazes de reduzir a magnitude das morbidades gastrointestinais em crianças com TEA.
A literatura mostra que crianças com TEA abrigam uma quantidade reduzida de bactérias benéficas quando comparadas a outros indivíduos. Estudos observaram menores quantidades de Bifidobacterium e maiores níveis de Lactobacillus nos autistas. Importante salientar que ambas as espécies de bactérias são consideradas positivas, pois afetam beneficamente o hospedeiro, uma vez que estimulam a proliferação ou atividade de populações de bactérias desejáveis no cólon.
É sabido que o uso de probióticos pode promover diversos benefícios para os indivíduos com autismo, restaurando o equilíbrio da microbiota intestinal, através da melhoria da barreira intestinal e sua permeabilidade, resultando na integridade de células do epitélio intestinal, onde seus papéis na função variam desde o eixo neural, com respostas eficazes no comportamento autista antissocial e, trato gastrointestinal com o aumento das bactérias benéficas levando a melhora de sintomas gastrointestinais recorrentes.
O uso desses probióticos também deve ser orientado por um profissional de saúde habilitado, assim como quaisquer suplementações, portanto evite a automedicação!
E, mais uma vez, deixo aqui meu recado como farmacêutico adepto de uma medicina natural: a alimentação balanceada é um dos principais tratamentos para quaisquer doenças, distúrbios ou alterações na sua saúde, portanto, escolha bem o que vai colocar para dentro do seu corpo.
Faça do seu alimento seu medicamento! Para saber mais sobre a relação entre intestino e cérebro, leia matéria clicando aqui.