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8 Livros que Inspiram

Muitos personagens são exemplos de astúcia, humor, caráter, compaixão, coragem, sabedoria, inteligência, enfim, das qualidades que permitem enfrentar a vida com alegria, destemor e gratidão

Ler é uma fonte de inspiração, autoconhecimento e um passatempo gostoso – Shutterstock

Escritores de todos os estilos, dos
épicos aos românticos, de dramaturgos a poetas, criaram tantos personagens que,
juntos, eles formariam uma multidão que às vezes parece mais real que as
pessoas de verdade. Uma humanidade que só existe no papel, mas nem por isso é
menos influente. As frases dessas criaturas da ficção ecoam em todas
as partes, dos discursos de políticos às conversas de botequim e suas vidas
viram teatro, filme. E mais importante: as verdades dessas pessoas nos inspiram
desde sempre.

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Muitos personagens são exemplos de
astúcia, humor, caráter, compaixão, coragem, sabedoria, inteligência, enfim,
das qualidades que permitem enfrentar a vida com alegria, destemor e gratidão.

Ulisses, que ficou dez anos no mar, era
corajoso, porém precisava aprender a ser humilde. Não foi poupado de
acontecimentos que o fizeram menos arrogante. Quantas vezes a vida exige uma
mudança de postura para que possamos avançar?

Já Dom Quixote, o sonhador, lutava
contra inimigos invisíveis, via monstros onde havia apenas moinhos de vento.
Certamente, você já se deparou com a força de seus devaneios e foi puxado para
a realidade por algo ou alguém. Nessa luta, Quixote contava com seu espirituoso
escudeiro, Sancho Pança.

Ler os livros em que surgem
suas admiráveis virtudes – e as circunstâncias que as fizeram aflorar – tem
sido um passatempo prazeroso, além de uma fonte de inspiração e
autoconhecimento, para gerações de leitores. A seguir, você fica na companhia de
alguns deles.

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1.    Dom Quixote e seu escudeiro, Sancho Pança

Virtudes: amizade, companheirismo, bom
humor.

Desafio: distinguir o que é sonho e o
que é realidade.

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Livro: O Engenhoso Fidalgo D. Quixote
de La Mancha, de Miguel de Cervantes (ed. 34).

Filme: Dom Quixote (1999), de Peter
Yates, com John Lithgow, Bob Hoskins e Isabella Rosselini.

Os personagens de Dom Quixote de La
Mancha, do espanhol Miguel de Cervantes (1547-1616), são imortais. Quixote é um
fidalgo do século 16 que enlouquece de tanto ler romances de cavalaria e sai de
armadura atrás de dragões e donzelas em apuros.

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Sancho Pança é um camponês das terras
de Quijada, pobre e faminto, convocado a acompanhar seu senhor como escudeiro.
Quixote fura odres de vinho (que vê como sendo gigantes), ataca moinhos de
vento, vive com os ossos quebrados. Depois de muitas aventuras, o velho
recupera a razão e volta para casa para morrer: declara que foi tudo ilusão.
Nessa hora, Sancho, em prantos, muda: diz que não, que ainda vão
cavalgar, salvar donzelas, matar gigantes. É a mais bela cena do livro.

Quixote e Sancho nos ensinam mais que o
humor e a amizade. Um é delírio e sonho, outro realidade e gula, e ambos se
completam: o poder do ideal e o valor do corpo, o humor da vida e a compaixão
por todos. Não é à toa que se tornaram imortais.

2.    Santiago, o pescador de O Velho e o Mar

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Virtudes: sabedoria, perseverança,
resistência.

Desafio: aprender a aceitar.

Livro: O Velho e o Mar, de Ernest
Hemingway (ed. Bertrand Brasil).

O velho Santiago, depois de 84 dias sem
pescar nada, volta ao mar. É questão de sobrevivência – e também de orgulho. O
oceano é a natureza e também o inconsciente, o abismo interior do homem. Assim
começa o livro O Velho e o Mar, que o escritor americano Ernest Hemingway
(1898-1961) escreveu em 1952.

A prova é dura: o sol é feroz, a
solidão total. O barco é podre, a vela remendada, mas Santiago conhece seus
inimigos: a maré, o vento, a astúcia do peixe. Depois de dias, o velho fisga a
maior presa de sua vida, um merlim gigante, que vale uma pequena fortuna. E
começa a luta.

Santiago segura a linha, que retalha
sua mão. O barco é arrastado por dias. Enfim o peixe morre. É tão grande que
Santiago não pode trazê-lo a bordo: amarra o corpo no casco, empreende o
retorno. Mas a carcaça atrai os tubarões. A volta é um pesadelo. Santiago luta
com os remos, perde a faca, o leme. Os tubarões dilaceram o peixe.

Por fim o velho chega, esgotado. Ao
lado do barco, só o esqueleto carcomido, imenso. Santiago venceu, mas a proeza
nada lhe rende. Ele adormece, e restam só o indomável espírito, a coragem
quieta, a vida. E a alegoria que Hemingway criou para nos inspirar para sempre.

3.    D’Artagnan, espadachim de Os Três Mosqueteiros

Virtudes: ousadia, ardor, ímpeto
juvenil.

Desafio: aprender a refletir e medir as
conseqüências de seus atos.

Livro: Os Três Mosqueteiros, de
Alexandre Dumas (ed. Ediouro).

Filme: Os Três Mosqueteiros (1993), de
Stephen Herek, com Charlie Sheen e Chris O’Donnell.

Principal personagem de Os Três
Mosqueteiros, obra do escritor francês Alexandre Dumas (1824-1895), D’Artagnan
tem uma personalidade marcada pelo ímpeto. É o guerreiro ousado que salta para
o combate.

A trama opõe os “mosqueteiros do Rei”
ao cardeal Richelieu, que urde uma intriga para separar o rei e a rainha da
França, que deu a um amante inglês uma jóia real. A missão impossível dos
heróis é recuperá-la a tempo de evitar a queda da rainha e a submissão do rei à
influência do cardeal.

Quase simplório, D’Artagnan difere dos
sofisticados companheiros, Porthos, Athos e Aramis. Na sua rude educação,
aprendeu uma só arte: a da espada. E sua maestria nela é a projeção de seu
caráter. A ousadia e rapidez no combate espelham a juventude e o ardor do
coração.

D’Artagnan capturou a admiração de
muitos corações juvenis, seja em peitos de adolescentes, seja nos de
anciãos. O veloz D’Artagnan nos provoca a entrar na senda da aventura. Ele
expressa a juventude no que ela tem de mais atirado. Como não se tornaria
eterno?

4.    Ulisses, o guerreiro de A Odisséia e A Ilíada

Virtudes: inteligência, astúcia,
coragem, fidelidade.

Desafio: evitar que as conquistas
tragam a arrogância e o orgulho.

Livros: A Odisséia, de Homero, tradução
de Manuel Odorico Mendes (ed. Edusp), e A Ilíada, de Homero, tradução de
Haroldo de Campos (ed. Arx).

Filme: Odisséia (1997), de Andrei
Konchalovsky, com Armand Assante, Isabella Rosselini e Irene Papas.

O protótipo do rebelde é o herói da
Guerra de Tróia imortalizado por Homero, maior poeta da Antigüidade. A maior
arma – e o maior tormento – desse guerreiro foi sua inteligência.

Atena, deusa grega do juízo claro, era
sua protetora. Foi Ulisses que imaginou o truque do Cavalo de Tróia (feito de
madeira e ofertado aos troianos, dentro dele os gregos se esconderam para
vencer a guerra). Quando Ulisses viu que a vitória tinha sido o resultado de
sua idéia, e não do poder dos deuses, ficou arrogante. Ignorou os sinais para
ser mais humilde e voltou para sua terra, a distante Ítaca.

Dez anos de tempestades e obstáculos
depois, Ulisses ainda não tinha chegado à casa e a mulher e o filho sofriam o
assédio de pretendentes ao trono, que o julgavam morto. Então ele se ajoelhou ante
os deuses e foi permitido a ele voltar a Ítaca, onde venceu os inimigos e
recuperou riquezas, reino e família.

Ulisses é fascinante porque é complexo.
Não é mau ou bom, mas humano. Seu orgulho é compreensível. Ele aprende,
duramente, que há forças (os “deuses”) maiores que nós, que não toleram a
arrogância. Por isso inspira e emociona a humanidade há 3 mil anos.

5.    Fada Morgana, sacerdotisa da lenda do rei Artur e
os cavaleiros da Távola Redonda

Virtudes: fé, cultivo da
espiritualidade e do feminino, respeito à natureza.

Desafio: deixar que a vida siga seu
rumo e evitar manipular as situações a seu favor.

Livro: As Brumas de Avalon, de Marion
Zimmer Bradley (ed. Imago).

Filme: As Brumas de Avalon (2001), de
Uli Edel, com Anjelica Huston, Julianna Margulies e Joan Allen.

A mais famosa feiticeira da literatura
ocidental vem da saga do rei Artur, contada desde a Idade Média em obras
como A Morte de Arthur, de Thomas Malory, e Parsifal, de Wolfram von
Eschenbach. Uma das mais belas versões da história é As Brumas de Avalon, da
americana Marion Zimmer Bradley (1930-1999).

No livro, o relato é feminino. Na
Bretanha governada por Artur, prospera a religião patriarcal dos cristãos. Mas
na misteriosa Avalon, onde Morgana, meia-irmã do rei, preside os ritos
ancestrais, veneram-se a Deusa Mãe e a crença pré-cristã das feiticeiras e do
saber oculto. Sua grande sacerdotisa é chamada Morgana das Fadas. A ilha de
Avalon, porém, está se afastando do mundo real, envolta numa bruma que só as
iniciadas podem cruzar.

Morgana é a imagem da iniciada. Só à
sua intuição ela é fiel e responde. Como maga, nos inspira o saber: o saber da
natureza, da magia, dos mistérios. Sabedoria, fé e coragem são suas virtudes, e
seu desafio é superar a arrogância, como ocorre com todos os que sabem.

6.    Miss Marple, a velhinha detetive dos livros de
Agatha Christie

Virtudes: perspicácia, intuição,
capacidade de dedução.

Desafio: confiar nos próprios talentos.

Livros: A Maldição do Espelho, Três
Ratos Cegos e Outras Histórias, Cem Gramas de Centeio (ed. Nova Fronteira),
Mistério no Caribe, Nemesis e Os Últimos Casos de Miss Marple (ed. Livros do
Brasil), de Agatha Christie.

Filme: Cem Gramas de Centeio (1987), de
Guy Slater, com Joan Hickson e Fabia Drake.

Célebre autora de romances policiais, a
inglesa Agatha Christie (1890-1976) tem, entre suas personagens, miss Jane
Marple. Apesar de ser a típica solteirona do interior, frágil, vestida à moda
antiga, amando tricô e fofocas, ela é hábil em decifrar crimes. Sua
inteligência sagaz olha os humanos sem se espantar com nada. Seu estilo muito
doméstico de resolver os mistérios pode ser conferido em mais de 20
livros, escritos entre 1932 e 1976.

O prolongado sucesso dos livros de
Marple, e suas inúmeras aparições em cinema, TV e teatro, prova que ela
cativou os leitores. Talvez porque expresse a superioridade da mente sobre o
corpo. Jane Marple é velha, sujeita a achaques, incapacitada para perseguições
e artes marciais. Mas, com poder dedutivo, atenção para detalhes, mente alerta,
inteligência e intuição, derrota os mais astutos e cruéis. Uma metáfora
inspiradora.

7.    Scherazade, contadora de histórias de As Mil e Uma
Noites

Virtudes: criatividade, coragem,
memória, astúcia.

Desafio: vencer a ansiedade e a pressa.

Livro: As Mil e Uma Noites (ed.
Ediouro)

Scherazade é talvez a mais famosa
mulher da literatura. É a heroína do conto “O Sultão Sanguinário”, o primeiro
do livro As Mil e Uma Noites, que inicia e liga todos os outros. O sultão
Shanriar mata a esposa por tê-lo traído e passa a casar-se toda noite com uma
virgem e a decapitá-la de manhã para que a traição não se repita. Scherazade
pede ao pai para desposar o sultão e teima até conseguir.

Na alcova, após o amor, a noiva conta
ao sultão uma história, mas antes do fim amanhece: é hora de a donzela morrer.
Curioso sobre o fim, Shanriar concede mais uma noite. E tudo se repete, pois
ela termina o conto anterior e começa outro, também detido pela manhã. E assim
por mil e uma noites.

Um dia, Scherazade diz: “Meu senhor,
não tenho mais histórias: dou-lhe agora minha vida”. Em lágrimas, Shanriar
responde que ela é a sua doce esposa, que lhe deu encanto, amor, magia, três
filhos e que a ama.

Difícil dizer qual das virtudes de Scherazade
inspira mais: coragem, inteligência, prodigiosa memória, sabedoria, fé, beleza,
sensualidade. Na dúvida, ficamos com seu amor, que nos legou essas histórias
imortais.

8.    Ana Terra, heroína de O Tempo e o Vento

Virtudes: força feminina, persistência.

Desafio: renascer das cinzas e aprender
a perdoar.

Livro: O Tempo e o Vento – O
Continente, Parte 1, de Érico Veríssimo (ed. Companhia das Letras).

Episódio crucial da obra máxima do
escritor gaúcho Érico Veríssimo (1905-1975), Ana Terra narra a história da
filha do pampa que, nas ermas terras do pai, encontra o ferido Pedro
Missionero, índio valente, sonhador e sensível. Irrompe a paixão, fatal para
ele. Quando Ana engravida, o pai e dois irmãos cumprem o código do colono
branco: Pedro é morto, como Ana previra em sonho. Da união nasce o menino
Pedro Terra.

São dias sem calendário, em algum
ano do século 18. Vêm os castelhanos invasores. Ana esconde o filho, a cunhada,
a sobrinha: finge ser a única mulher na casa. O pai e os irmãos morrem. Os
sobreviventes partem para a recém-fundada Santa Fé. Lá Ana ergue seu rancho e
torna-se parteira.

Vêm as guerras platinas. Pedro Terra, já moço, é convocado. Volta vivo,
mas é chamado outra vez. Ana, mãe da terra, novamente o aguarda num silêncio
que encerra o episódio, com força imensa. Ana tem as virtudes da Mãe Terra:
procriadora, protetora, invencível. E, não por acaso, parteira, pois, como a
própria vida, renasce sempre.