Síndrome da Impostora: quando acreditamos que o sucesso é um acaso e não mérito
Embora não seja oficialmente reconhecida como transtorno mental, a Síndrome da Impostora impacta a autoestima e a saúde emocional

Embora não seja oficialmente reconhecida como transtorno mental, a Síndrome da Impostora impacta a autoestima e a saúde emocional
Sabe aquela sensação de que, a qualquer momento, alguém vai descobrir que você não é tão competente quanto pensam? Como se todo o seu esforço e suas conquistas fossem fruto apenas de um golpe de sorte, e não de seus talentos e dedicação? A Síndrome da Impostora (ou do Impostor) é um fenômeno psicológico vivido por muitas pessoas.
As psicólogas Pauline Clance e Suzanne Imes foram as primeiras a estudar esse fenômeno, introduzindo o conceito de ‘Fenômeno do Impostor‘ em 1978. No entanto, essa questão já era observada anteriormente. Sigmund Freud, em seu artigo de 1916, intitulado ‘Os que Fracassam ao Triunfar‘ (também traduzido como ‘Arruinados pelo Êxito‘), descreveu situações em que indivíduos, ao alcançarem o sucesso, experimentam sentimentos de culpa ou ansiedade, os levando a sabotar suas conquistas.
Freud sugeriu que esses comportamentos podem estar ligados a conflitos inconscientes e a aspectos da moralidade que impõem punições frente ao sucesso. Pensamentos como “Sou uma fraude, logo descobrirão”, “Sempre ouvi que não sou inteligente ou esforçada” ou “Quem sou eu para ter sucesso, se tantas vezes vi minha família fracassar?” são comuns entre aqueles que vivenciam essa síndrome.
Para Clance e Imes, a Síndrome da Impostora é um padrão de pensamento no qual a pessoa sente que não merece reconhecimento por suas conquistas. Há uma tendência a atribuir o próprio sucesso a fatores externos, como sorte ou influência de terceiros. Esse conjunto de autopercepções, muitas vezes irreais, acompanha sentimentos de ansiedade, medo, falta de autoconfiança, culpa e frustração, além de uma expectativa constante de a descobrirem como uma fraude. Uma das principais consequências é a autossabotagem, que se manifesta na dúvida constante sobre suas habilidades, na comparação excessiva e no perfeccionismo.
Embora não seja oficialmente reconhecida como um transtorno mental, a Síndrome da Impostora impacta profundamente a autoestima e a saúde emocional. Estudos mostram que ela afeta, principalmente, mulheres em ambientes profissionais ou acadêmicos, especialmente aquelas que romperam barreiras e alcançaram espaços historicamente negados. Não é incomum que, mesmo após anos de estudo e dedicação, uma mulher se pergunte: “Eu realmente mereço estar aqui?”
A autossabotagem entre as mulheres tem diversas motivações, desde fatores individuais, desde a história e o contexto de vida de cada uma, até influências sociais e culturais. Por gerações, a sociedade invisibilizou e subestimou as competências femininas. A psicóloga Brené Brown, especialista em vulnerabilidade e autoestima, explica que a vergonha e o medo de não sermos suficientes alimentam essa sensação. Paradoxalmente, quanto mais bem-sucedida a mulher se torna, maior pode ser a sensação de fraude. Você conhece alguém assim?
Lidar com a Síndrome da Impostora exige, antes de tudo, reconhecer sua existência na própria dinâmica pessoal. Se ela está presente, vale a pena identificar quais crenças sobre sucesso, bem-estar e reconhecimento influenciam essa percepção. Qual a origem dessas crenças? O que você viu, ouviu e vivenciou na infância e adolescência? Quais experiências de fracasso reforçaram a ideia de que o sucesso é uma fraude?
Identificar, refletir e observar são passos iniciais do processo de autoconhecimento que podem levar à desconstrução de crenças antigas e inconscientes. Nem sempre essa transformação é simples, pois envolve razões muitas vezes profundas e difíceis de acessar. Nesse sentido, a psicoterapia pode ser uma ferramenta valiosa.
Além disso, reconhecer o processo de autossabotagem e as crenças que o alimentam pode ajudar a reduzir a sensação de impostora. Um exercício útil é perguntar-se: “Quais habilidades e esforços me trouxeram até aqui?”. Outra estratégia eficaz é manter um registro das conquistas e dos desafios enfrentados, anotando, ao lado, as razões que levaram a cada um desses resultados. Esse diário pode oferecer uma visão mais realista da própria trajetória, evitando que insucessos isolados definam sua autopercepção.
Por fim, compartilhar essas inseguranças com outras mulheres pode ser uma maneira poderosa de perceber que essa não é uma experiência individual. Conversar com pessoas de confiança fortalece a ideia de que essa sensação não define quem você é, mas sim um desafio que pode ser enfrentado e superado.
*Texto escrito por Blenda Oliveira, doutora em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). É autora do livro ‘Fazendo as Pazes com a Ansiedade‘